MPT em São Paulo processa CPTM por recorrentes acidentes fatais entre seus funcionários e trabalhadores terceirizados durante as atividades laborais

Investigação conduzida pelo Ministério Público do Trabalho aponta que, apesar de casos frequentes de acidentes ao longo dos anos, a CPTM se omitiu no cumprimento da legislação trabalhista e das Normas Regulamentadoras de saúde e segurança.

 

São Paulo, 27 de julho - O Ministério Público do Trabalho em São Paulo ajuizou uma ação civil pública contra a Companhia Paulista de Transportes Metropolitano para que seja obrigada a adotar providências imediatas e de médio e longo prazo, incluindo medidas estruturais e organizacionais, de melhoria da gestão de segurança da empresa e dos processos de trabalho, para garantir um meio ambiente de trabalho seguro e sadio para os trabalhadores da CPTM e para os terceirizados. Investigações apontam que em menos de dois anos, entre 2009 e 2011, ocorreram 18 acidentes nas instalações da CPTM, sendo nove deles fatais.

Entre os pedidos do MPT em ação ajuizada pela procuradora do Trabalho Tatiana Leal Bivar Simonetti estão a modernização de sistemas de dormentes e equipamento de sinalização, o mapeamento de locais e situações para a realização de manutenção dos trilhos com possibilidades de interdição em toda a extensão de suas vias férreas, ampliação da quantidade de bases para as equipes de manutenção, mapeamento de situações de incidentes e eventos críticos com potencial de lesão grave e fatal, implantação de um Programa de Prevenção de Atropelamentos de Trabalhadores e outros.

Os pedidos do MPT foram formulados com base em documentação da Auditoria Fiscal do Trabalho e da Coordenaria de Vigilância em Saúde (COVISA), que fizeram fiscalização dos locais e análise dos acidentes, e de resultado do Projeto de Pesquisa “Análise e construção cooperativa de soluções para prevenção de acidentes de trabalho em empresa Ferroviária de Transporte Metropolitano de Passageiros”, realizado por um Grupo de Trabalho com equipe multidisciplinar, integrada por representantes e pesquisadores do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública (USP),  do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu (UNESP), de uma equipe de profissionais interdepartamental da CPTM, da Fundacentro e por perito de Meio Ambiente de Trabalho do Ministério Público do Trabalho em São Paulo.

O grupo de pesquisadores trabalhou por mais de três anos de 2016 a 2019, e apresentou os resultados da pesquisa colaborativa realizada com a metodologia do Laboratório de Mudança, realizada a partir do saber, da experiência e do protagonismo dos próprios profissionais da CPTM, e constituiu prova técnica e cientifica de todas as inadequações relacionadas ao histórico de acidentes ocorridos na CPTM. O grupo identificou as falhas organizacionais e apresentou as sugestões de soluções construídas coletivamente, inclusive com a participação de profissionais da CPTM. Com base neste trabalho científico, o MPT sugeriu que a empresa elaborasse um Plano de Ação, com a colaboração de seus empregados, com cronograma para implementação das modificações técnicas sugeridas nos relatórios apresentados. A CPTM, porém, se negou a apresentar o Plano de Ação, argumentando que já adotava as medidas indicadas no relatório técnico do Grupo de Trabalho para minimizar a ocorrência de acidentes de trabalho, de forma contínua. Em abril de 2021, a CPTM apresentou o Planejamento Estratégico desenvolvido no ano de 2019 para implementação de melhorias no período de 2020 a 2024, que contemplam algumas irregularidades apontadas pela equipe técnica dos pesquisadores, entretanto não foram apresentadas provas de sua adequação.

 “Considerando a solidez do arcabouço probatório constante nos autos e considerando que a CPTM se recusou a implementar as soluções propostas a partir de metodologia participativa, que contou com a colaboração  de profissionais de diferentes áreas e níveis hierárquicos da própria empresa e se negou a promover as adequações organizacionais e estruturais, voluntariamente, a fim de evitar novos acidentes fatais de trabalho, não restou outra alternativa ao MPT senão o ajuizamento da Ação Civil Pública a fim de exigir medidas e obrigações que evitem mais perdas humanas”, explica a procuradora Tatiana Bivar.

Entenda o caso

Em 2011, a partir de uma reportagem pulicada em jornal, que trazia notícia de que em menos de duas semanas cinco trabalhadores da CPTM haviam morrido   atropelados durante o exercício de suas atividades, O MPT em São Paulo deu início a um inquérito civil para investigar as causas dos acidentes. Seguindo a cronologia das diligências investigativas e das provas produzidas no inquérito civil, em fevereiro de 2012, em virtude da análise dos acidentes inicialmente noticiados na mídia, a auditoria fiscal do trabalho apresentou um extenso relatório elencando 18 acidentes de trabalho ocorridos nas instalações da CPTM entre agosto de 2009 e dezembro de 2011, envolvendo trabalhadores diretos da CPTM e terceirizados. Desse total de acidentes, nove deles foram fatais, causados por atropelamento nas vias férreas da CPTM.

Dados colhidos pelo Grupo de Trabalho entre os anos de 2009 a 2018, tendo como base as Comunicações de Acidentes de Trabalho (CAT) registradas formalmente, apontam o grande número de trabalhadores atingidos ao longo do tempo, com mortes e incapacidades. Em 10 anos foram registrados 631 benefícios previdenciários concedidos diretamente pela CPTM, uma média aproximada de 1,2 benefícios por semana, ou quase 5 benefícios previdenciários mensais, sem se considerar os benefícios concedidos aos trabalhadores terceirizados, submetidos aos mesmos riscos.

Nesse período, diante das primeiras conclusões sobre algumas causas imediatas dos acidentes de trabalho, foi apresentado pelo MPT proposta de Termo de Ajuste de Conduta à CPTM, que recusou a assinatura, alegando o cumprimento de todas as obrigações sugeridas. Por tratar-se de tema extremamente complexo, em 2016, o MPT e a CPTM firmaram um Termo de Cooperação com vigência de 30 meses, cujo objeto era a análise e identificação dos riscos organizacionais e de segurança de trabalho para a construção cooperativa de soluções para a prevenção de acidentes de trabalho na empresa.

Como resultado, as contradições identificadas serviriam de base para criação, desenvolvimento, teste e implantação de soluções concretas, a serem aplicadas voluntariamente pela CPTM, ou exigidas pelo MPT por meio da assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta ou propositura de Ação Civil Pública. A empresa, porém, seguiu ignorando sua responsabilidade.

Na ação ajuizada, a procuradora pede indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais). “Mesmo após desenvolvimento de todo um complexo trabalho do grupo interinstitucional que demonstrou cabalmente as falhas no processo organizacional empresarial, as quais têm tido como consequência repetidos acidentes de trabalho, a empresa tem se recusado a admitir suas deficiências e corrigir os problemas. Considerando ainda o grande número de trabalhadores atingidos ao longo do tempo, com mortes e incapacidades e todo o recurso público gasto com esses acidentes bem como o desrespeito a elevado número de normas positivas, é razoável a fixação da indenização à sociedade no valor solicitado nesta ação”, afirma Bivar.

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