Metade das costureiras refugiadas e imigrantes em São Paulo trabalha na informalidade
44% trabalham mais de 12 horas por dia. Dado é parte de pesquisa divulgada hoje pelo MPT-SP e parceiros, com diagnóstico inédito sobre costureiras migrantes e refugiadas de São Paulo
São Paulo, 29 de agosto de 2022 - Mulheres, mães e com renda menor que dois salários mínimos por mês - abaixo da remuneração média na indústria da moda. Esse é o retrato das costureiras, de acordo com um diagnóstico lançado nesta segunda-feira (29) pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em São Paulo, pelo Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS) e pela ONU Mulheres.
O estudo é inédito e mapeou quais são as condições de trabalho de costureiras atuantes na região metropolitana de São Paulo. A área concentra 12% do total de vagas de emprego do setor de confecção no país. Além de fazer ampla revisão bibliográfica, o estudo ouviu 140 costureiras, que contaram, também, sobre suas aspirações para o futuro. Entre as entrevistadas, estão refugiadas e migrantes (correspondendo a 30,7% do total da amostra).
De acordo com o diagnóstico, 31% das brasileiras trabalham com carteira assinada, enquanto esse percentual é de apenas 7% entre as refugiadas e imigrantes. Neste último grupo, a maioria (51,2%) atua de maneira autônoma, sem vínculo formal. O estudo foi viabilizado com recursos oriundos da aplicação da legislação trabalhista, destinados pelo MPT-SP. A iniciativa foi coordenada pelo UNOPS, com apoio técnico da ONU Mulheres.
A precariedade em que se veem as costureiras imigrantes e refugiadas fica ainda mais clara pela jornada de trabalho: cerca de 44% delas trabalham mais de 12h por dia, contra 2% de costureiras brasileiras que realizam a mesma carga horária. Mesmo assim, a situação destas últimas não é muito melhor: 45% trabalham entre 9 e 11h por dia, realizando horas extras como regra.
A pesquisa abrangeu também aspectos sociais e econômicos que influenciam a vida dessas profissionais. Foram levantados dados como a idade das trabalhadoras, a escolaridade, a raça, se têm ou não filhos/filhas e o local onde desenvolvem suas atividades laborais. Menos da metade delas (45%), por exemplo, concluiu o ensino médio e a maioria (62,1%) exerce a profissão na própria residência.
Outros dados significativos dizem respeito à renda familiar das trabalhadoras - cuja média está abaixo do recebido por outros profissionais da indústria têxtil - e ao fato de que 80% delas são mães. A grande maioria sente a necessidade de haver mais políticas públicas voltadas para o cuidado com as crianças.
Fast fashion
A pesquisa foi feita pela Tewá 225, consultoria especializada em socioeconomia, e confirmou o fenômeno fast fashion (que exige produção acelerada das peças e coloca muitas trabalhadoras e trabalhadores em situação de precariedade).
"O principal problema é que a cadeia está estruturada para atender à alta demanda, implicando em menores preços e grandes volumes. As condições de trabalho vão sendo precarizadas, para manter o preço pago por peça baixo. Na base dessa cadeia, está a mulher, muitas vezes imigrante, que não consegue sair da máquina de costura, tentando atingir uma renda mínima para sua família, ganhando centavos por peça confeccionada", comenta a sócia consultora da Tewá, Luciana Sonck.
A representante da ONU Mulheres Brasil, Anastasia Divinskaya, avalia que as mulheres são as mais afetadas pela informalidade e pela carga da jornada dupla, quando também assumem as tarefas de cuidado. “Infelizmente, essa tem sido a realidade conhecida há décadas, agravada, ano após ano, com os comportamentos de consumo adotados pela sociedade”, aponta.
“O que buscamos com este estudo foi conhecer em mais detalhes as relações de trabalho na cadeia da moda, de que forma elas agravam as vulnerabilidades das mulheres refugiadas e migrantes no Brasil, além de gerar dados e evidências que possam subsidiar políticas públicas e mobilizar o setor privado e as autoridades para esse sistema que afeta a todas e todos nós”, completa. A ideia é que o diagnóstico contribua para a elaboração de um plano estratégico voltado ao empoderamento econômico das mulheres costureiras.
O UNOPS é parceiro do Ministério Público do Trabalho desde 2019, tendo já implementado uma série de projetos - que vão desde o fomento ao empreendedorismo entre grupos mais vulneráveis a ações de combate à COVID-19. “Nosso compromisso é o de fortalecer a ação institucional do MPT em todo o território e, ao mesmo tempo, impulsionar a promoção da igualdade de gênero, da diversidade e da inclusão. Este projeto, com resultados tão robustos, é um exemplo perfeito de como trabalhamos nesta parceria”, comenta a diretora e representante do UNOPS Brasil, Claudia Valenzuela.