Catadoras de materiais recicláveis lançam livro “Quarentena da resistência” nesta sexta-feira (10)
Livro faz parte de uma série de iniciativas realizadas conjuntamente pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) para assegurar o trabalho decente para pessoas em situação de vulnerabilidade. Evento virtual ocorre às 19h e será transmitido na página da OIT Brasil no Instagram
São Paulo – Vinte e uma catadoras de materiais recicláveis lançam nesta sexta-feira (10), às 19h, o livro “Quarentena da resistência”, com histórias sobre exclusão social, vulnerabilidade e busca por condições de vida mais dignas. A publicação integra uma série de iniciativas realizadas conjuntamente pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). O evento será transmitido na página da OIT Brasil no Instagram e marca o Dia Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, lembrado também no dia 10 de dezembro.
Publicado pela editora Coopacesso, o livro “Quarentena da Resistência” é parte de um projeto homônimo que integra uma ampla iniciativa lançada conjuntamente pelas duas instituições em 2020 com o propósito de promover o trabalho decente para pessoas em situação de vulnerabilidade. Um desses grupos é composto por catadoras e catadores de materiais recicláveis, uma categoria historicamente com menos direitos garantidos, trabalho marcado pela precariedade e insegurança e baixa remuneração. No escopo do projeto, está o documentário ‘As Recicláveis”, lançado em 2020 e que mostra a valor do serviço ambiental prestado por catadoras e catadores de materiais recicláveis, e ações realizadas com prefeituras e cooperativas para implementar a legislação referente, formalizar organizações de trabalhadores(as) e garantir condições de saúde e segurança para a categoria.
As atividades avançaram até que, em 2020, a pandemia da Covid-19 deflagrou uma crise sem precedentes com impactos na saúde, na economia e no mundo do trabalho. A crise afetou duramente a geração de renda e a sobrevivência de grupos que já se encontravam em situação de vulnerabilidade, incluindo trabalhadores e trabalhadoras com salários mais baixos, pouco ou nenhum acesso à medida de proteção social, e inseridos na economia informal, além jovens, mulheres, população negra, indígenas e migrantes.
Neste contexto, foi criado o projeto “Quarentena da Resistência”, uma parceria entre a OIT, o MPT em São Paulo, a Festa Literária das Periferias (FLUP) e a Cooperativa Central do ABC (Coopcent ABC), com o apoio da Universidade Federal do ABC (UFABC) e os Laboratórios da Palavra e de Teorias e Práticas Feministas do Programa Avançado de Cultura Contemporânea da Faculdade de Letras/UFRJ, para promover a capacitação e a proteção de mulheres catadoras de materiais recicláveis organizadas em cooperativas. A metodologia promoveu a formação contínua sobre segurança e saúde do trabalho, economia solidária, organização financeira e cooperativismo.
"Inspiradas em Carolina Maria de Jesus, as catadoras, trabalhadoras severamente atingidas pela pandemia, em sua maioria negras, encontraram um lugar de fortalecimento e luta pela palavra e compartilhamento das dores e afetos. O potencial trazido pela literatura, a partir de reflexões sobre trabalho, racismo, gênero e outras questões que atravessam a vida das catadoras, reflete na organização do grupo e na defesa de direitos.", afirma Elisiane dos Santos, procuradora do Trabalho do MPT-SP e uma das idealizadoras do projeto.
"Além disso, o resgate da história de organização da categoria profissional, agora em livro, mostra à sociedade a importância fundamental do trabalho que realizam, ao tempo em que cobra do Poder Público as condições e políticas públicas para a valorização e reconhecimento do trabalho de milhares de mulheres e famílias no Brasil, trabalho este do qual depende a vida das pessoas e do planeta. Essa obra deve ser lida por todos e todas.", acrescenta ela.
Durante sete meses, semanalmente, 21 mulheres de cidades do ABC Paulista participaram, de forma virtual, de atividades de formação e oficinas de criação literária promovidas pela FLUP para estimular a escrita e o protagonismo de cada uma na elaboração do livro. Cada participante recebeu uma bolsa de estudos mensal no valor de R$ 385 durante quatros meses, destinada ao custeio de internet para os encontros virtuais e cestas básicas para assegurar a segurança alimentar e nutricional da aluna e de sua família.
Nas oficinas, as catadoras leram e debateram o livro “Quarto de Despejo: Diário de uma favelada”, da escritora Carolina Maria de Jesus, compartilharam experiências de vida e as moldaram em narrativas biográficas inspiradoras. A partir de suas histórias, manifestam-se problemas relacionados à brutal situação de desigualdade social, a violência doméstica, a violência urbana, a fome e a busca por condições de vida mais dignas a partir do que a sociedade descarta no lixo.
“Minha leitura tinha ido até o beabá e nem lembro se sabia ele todo. Vários sonhos que eu sonhava hoje eu sinto que realizei: é aprender a ler. Eu vou olhando, soletrando, agora com a chegada do livro da Carolina Maria de Jesus também… já aprendi muita coisa. Ah, eu tô tão contente. E vou aprender mais.”, conta Maria das Dores Pereira Primo, da Cooperativa de Material Reciclável de Ribeirão Pires (Cooperpires), de Ribeirão Pires.
A iniciativa ganhou destaque na última terça-feira (7) no programa “Encontro com Fátima Bernardes”, da Rede Globo. Na reportagem, uma das autoras do livro, Dona Maria, falou sobre a inspiração na escritora Catarina Maria de Jesus e mostrou sua rotina coletando materiais recicláveis. Clique aqui para assistir à reportagem.
Política Nacional de Resíduos Sólidos
No Brasil, a Lei nº 12.305 de agosto de 2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que reconhece a atuação de catadores e a catadoras de materiais recicláveis como agentes imprescindíveis à gestão dos resíduos sólidos. Dentre outros pontos, a Lei, por meio da PNRS, prevê a determinação de "metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis". Entretanto, a Lei não tem sido implementada pelos municípios brasileiros e a discriminação dirigida a esse grupo persiste.
Com o objetivo de promover a implementação da PNRS, o MPT criou o Grupo de Trabalho (GT) Inclusão Socioprodutiva de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis, vinculado à Coordenadoria Nacional de Promoção da Regularidade do Trabalho na Administração Pública (Conap). O GT tem como objetivo promover a inclusão socioprodutiva dos catadores e das catadoras de materiais recicláveis, bem como para o enfrentamento do trabalho infantil na coleta do lixo e para a promoção do trabalho decente (a exemplo das condições de saúde e segurança no trabalho), o que implica na regularização da contratação, pela administração pública, das associações e cooperativas de catadores e catadoras de materiais recicláveis.
Com informações da OIT Brasil